Dia Internacional da Mulher: conheça o ecofeminismo

Grupo de mulheres diversas em um momento de superação
Mulheres de várias etnias se unem para superar desafios, destacando a importância da união feminina na busca por justiça ambiental e social

O ecofeminismo é mais que uma “palavra da moda”. É um movimento consolidado que une a luta pelos direitos das mulheres com a defesa do meio ambiente, propondo transformações profundas na sociedade.

Mas o que isso significa na prática?

Esta abordagem parte da ideia fundamental de que a dominação da natureza e a opressão das mulheres têm raízes comuns e se manifestam de formas interconectadas em nosso mundo.

Como esse “movimento verde” está presente no mundo e por que você deveria prestar atenção?

Historicamente, tanto a natureza quanto as mulheres foram vistas como “inferiores” e exploradas por sistemas de poder patriarcais. Segundo dados da ONU, oito em cada dez pessoas obrigadas a se refugiar por causa de desastres climáticos são mulheres, evidenciando como as questões ambientais afetam desproporcionalmente este grupo.

O ecofeminismo busca desafiar essa lógica, propondo uma nova forma de pensar sobre a relação entre humanos e meio ambiente, baseada no respeito, na interdependência e na justiça social.

Mas, de onde surgiu o termo?

Origens e evolução do ecofeminismo

O termo “ecofeminismo” foi cunhado pela escritora francesa Françoise d’Eaubonne em seu livro “Le Feminisme ou la Mort” (Feminismo ou Morte) publicado em 1974.

Posteriormente, em 1978, d’Eaubonne fundou na França um movimento ecofeminista, caracterizando-o como:

“A capacidade das mulheres, como impulsoras de uma revolução ecológica, de ocasionar e desenvolver uma nova estrutura relacional de gênero entre os sexos, bem como entre a humanidade e o meio ambiente”.

A partir dos anos 1970, o movimento começou a se difundir globalmente, ganhando força nos Estados Unidos e em diversos países da Europa, e posteriormente alcançando expressão significativa em regiões do Sul Global, onde as mulheres têm sido protagonistas em lutas por justiça ambiental e social.

Nas últimas três décadas, houve um aumento significativo na participação das mulheres em protestos contra catástrofes ambientais e em manifestações em defesa dos territórios.

Este crescimento reflete não apenas a maior conscientização sobre questões ambientais, mas também o reconhecimento do papel que as mulheres desempenham na proteção e gestão sustentável dos recursos naturais.

As vertentes do ecofeminismo: essencialista vs. crítica

Dentro do ecofeminismo, existem diferentes correntes de pensamento, sendo duas das principais o ecofeminismo essencialista e o ecofeminismo crítico.

O ecofeminismo essencialista valoriza a conexão intrínseca das mulheres com a natureza, muitas vezes associada à capacidade de gerar vida e cuidar do outro. Esta vertente busca resgatar saberes e práticas tradicionais de cuidado com o meio ambiente, frequentemente lideradas por mulheres em comunidades rurais e indígenas. Vandana Shiva, física e filósofa indiana, é uma das principais representantes desta corrente e afirma que “as mulheres têm uma conexão especial com o meio ambiente através de suas interações diárias e esta ligação tem sido ignorada”.

Ela destaca que “as mulheres em economias de subsistência que produzem a riqueza em parceria com a natureza, têm sido especialistas em seu próprio direito sobre o conhecimento holístico e ecológico dos processos da natureza”.

Por outro lado, o ecofeminismo crítico questiona a ideia de uma ligação natural entre mulheres e natureza, argumentando que essa associação pode reforçar estereótipos de gênero. Esta corrente enfatiza a importância de analisar as relações de poder e as estruturas sociais que perpetuam a opressão das mulheres e a degradação ambiental. O ecofeminismo crítico frequentemente incorpora perspectivas marxistas e anticapitalistas, enfatizando como o sistema econômico dominante explora simultaneamente as mulheres e a natureza.

Um artigo publicado nos Periódicos da UFC estabelece uma comparação entre essas duas vertentes, identificando as lutas políticas que cada uma empreende. O estudo procura entender como as teorias ecofeministas constroem a imagem das mulheres como cuidadoras e sujeitos, e quais são as subjetividades que produzem.

Mulheres na linha de frente: exemplos de ativismo ecofeminista

Movimento Chipko, Índia, 1970: um exemplo de resistência inspirador!
Mulheres protegeram florestas abraçando árvores (daí o nome Chipko) para impedir o desmatamento, defendendo a natureza e suas comunidades da exploração predatória.

 

O ecofeminismo não é apenas uma teoria, mas também uma prática manifestada em diversos movimentos sociais ao redor do mundo. Em todo o planeta, mulheres estão liderando iniciativas de proteção ambiental, promovendo a agricultura sustentável, defendendo os direitos das comunidades tradicionais e lutando contra a exploração predatória dos recursos naturais.

Um exemplo notável é o trabalho das mulheres indígenas na Amazônia, que há décadas denunciam o desmatamento, a grilagem de terras e a violência contra seus povos. Elas utilizam seus conhecimentos ancestrais para proteger a floresta e garantir a sobrevivência de suas culturas.

No Sul global, as mulheres desempenham um papel fundamental no apoio aos sistemas agroalimentares locais, protegendo as sementes e os conhecimentos ancestrais. Elas são responsáveis pela reprodução da vida das comunidades camponesas através do papel essencial de alimentar e cuidar.

Um caso emblemático é o movimento Chipko na região de Uttar Pradesh-Índia (década de 1970), onde mulheres abraçaram árvores (Chipko quer dizer abraço) para impedir o desmatamento, demonstrando uma forma pacífica mas poderosa de resistência.

No Brasil, o movimento de mulheres agricultoras tem ganhado força na defesa da agroecologia como uma alternativa ao modelo de produção agrícola industrial.

 

Ecofeminismo e a ciência: uma perspectiva necessária

 Mãos de mulher seguram muda de árvore
Mãos de mulher seguram uma muda de árvore, simbolizando o compromisso com o futuro

 

O ecofeminismo também tem ganhado espaço nas pesquisas científicas, oferecendo perspectivas para analisar problemas ambientais e buscar soluções mais justas e sustentáveis.

Um estudo publicado na Revista LIINC em Revista investigou como o ecofeminismo tem sido abordado em periódicos científicos nacionais. A pesquisa identificou poucos artigos que adotam essa perspectiva, mas demonstra o potencial do ecofeminismo para enriquecer diferentes áreas do conhecimento.

O estudo, publicado em maio de 2022, é exploratório e se baseia em dados empíricos, utilizando levantamento e estudo da literatura especializada para coleta de dados. Os resultados mostram que, embora ainda haja pouca pesquisa abrangendo o ecofeminismo como perspectiva, o tema tem potencial para ser explorado em diferentes áreas, indicando uma lacuna no conhecimento científico que precisa ser preenchida.

Nas universidades brasileiras, pesquisas como “Ecofeminismo e comunidades indígenas” analisam “a organização e dinâmica de comunidades indígenas por meio de indicadores de sustentabilidade ambiental”. Outro estudo relevante é “Educação ambiental crítica e ecofeminismo: uma potente lente epistemológica para uma educação ambiental popular e feminista”, que elabora uma reflexão crítica sobre a articulação entre educação ambiental e ecofeminismo.

A pesquisa também destaca a importância de se considerar a perspectiva ecofeminista em áreas como a sociologia, a antropologia, a geografia e a ciência política, para compreender as complexas relações entre gênero, meio ambiente e poder.

Na perspectiva ecofeminista, a ciência deve ser orientada não apenas para o avanço tecnológico, mas para a promoção da vida e bem-estar das comunidades.

Ecofeminismo e comunidades sustentáveis

O movimento de ecovilas representa uma alternativa de organização social de baixo impacto sobre os componentes naturais e de novos valores condizentes com o bem-estar da vida social. Muitas dessas iniciativas são informadas por princípios ecofeministas que valorizam o cuidado, a cooperação e a sustentabilidade.

A Ecovila de Piracanga, localizada no município de Maraú, litoral sul da Bahia, Brasil, é um exemplo de comunidade onde pode-se observar a relação entre ecofeminismo e sustentabilidade ambiental.

Pesquisas neste campo sugerem que “há uma significativa correlação entre indicadores de sustentabilidade ambiental e indicadores ecofeministas no nível local, apontando para soluções inovadoras para a relação sociedade-natureza”.

Devido à sua pluralidade de visões, objetivos e estratégias, a perspectiva ecofeminista é capaz de integrar simultaneamente múltiplas abordagens e explicar os vínculos históricos entre o capitalismo neoliberal, o mito do progresso moderno, a violência contra as mulheres, o extrativismo e as mudanças climáticas.

Esta abordagem fornece uma rica base teórica e prática para o desenvolvimento de comunidades sustentáveis que respeitam tanto as necessidades humanas quanto os limites planetários.

O ecofeminismo postula que os projetos de mulheres e as resistências feministas não visam apenas desafiar as relações de poder e fornecer alternativas para combater a crise, mas também construir práticas coletivas que apostam na igualdade, na justiça social e na sustentabilidade.

Estas práticas frequentemente envolvem a problematização da valorização social e econômica do trabalho de cuidado, reconhecendo o papel crucial das mulheres na sustentação da vida comunitária.

 

O futuro é ecofeminista: como você pode se juntar a este movimento?

Se você se interessa por meio ambiente e direitos das mulheres, aqui estão algumas formas de se juntar a esse movimento:

  1. Informe-se: Leia livros, artigos e notícias sobre ecofeminismo. Autoras como Vandana Shiva, Françoise d’Eaubonne e Ivone Gebara oferecem perspectivas valiosas sobre o tema. Siga ativistas e organizações que trabalham nessa área em redes sociais e participe de eventos e debates.
  2. Apoie iniciativas locais: Procure grupos e projetos ecofeministas em sua comunidade e participe de suas atividades. Cooperativas de mulheres agricultoras, hortas urbanas coletivas e grupos de defesa ambiental frequentemente incorporam princípios ecofeministas, mesmo quando não utilizam explicitamente este termo.
  3. Adote práticas sustentáveis: Reduza seu consumo, reutilize materiais, recicle, economize água e energia. Considere mudar para uma dieta mais baseada em vegetais e, quando possível, compre alimentos produzidos por mulheres agricultoras locais em sistemas agroecológicos.
  4. Defenda os direitos das mulheres: Lute contra a violência de gênero, o assédio sexual e a discriminação no trabalho. Reconheça que as questões ambientais têm impactos diferenciados sobre as mulheres e inclua esta perspectiva em discussões sobre sustentabilidade.
  5. Participe de pesquisa-ação: Se você está em ambiente acadêmico, considere abordagens de pesquisa-ação participante que trabalhem com mulheres em situação de vulnerabilidade socioambiental. Estas metodologias permitem “produzir conhecimento, emancipação e transformação social”.
  6. Compartilhe informações: Use suas redes sociais para divulgar o ecofeminismo e inspirar outras pessoas a se juntarem à causa. Compartilhe histórias de mulheres que estão fazendo a diferença em suas comunidades através de práticas sustentáveis.

O ecofeminismo é um movimento em constante evolução, que se adapta aos desafios do nosso tempo. Ao unir a luta pela justiça social e ambiental, ele nos oferece uma nova esperança para um futuro mais igualitário e sustentável, onde tanto as mulheres quanto a natureza sejam valorizadas e respeitadas em sua plenitude.

Fontes:

Lucilaine Souza

Lucilaine Souza - Curadora de Conteúdo Ambiental Formada em Letras e especialista em Formação Humana, Lucilaine traz para o Planeta Azulinho uma abordagem única que une educação socioemocional e sustentabilidade. Com 15 anos de experiência em projetos pedagógicos, dedica-se a transformar conceitos complexos sobre meio ambiente em conteúdos acessíveis e inspiradores. Sua expertise em desenvolvimento educacional e paixão ambiental fundamenta os guias práticos do site, como "Sustentabilidade para Famílias" e "Projeto de Vida Verde". No Planeta Azulinho, lidera a curadoria de conteúdos que conectam hábitos cotidianos à preservação do planeta, sempre com rigor científico e uma visão humanista.

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