A crise climática se intensifica, e com ela, a busca por soluções que possam mitigar seus impactos devastadores. Uma dessas soluções, que tem ganhado destaque, é o seguro climático.
Mas será que essa ferramenta é suficiente para enfrentar a magnitude do problema?
Ou estamos apenas colocando um “curativo” em uma ferida muito mais profunda?
Para alguns, os seguros climáticos representam uma forma de adaptação inteligente às mudanças climáticas, permitindo que empresas, agricultores e indivíduos se protejam contra os riscos crescentes.
No entanto, essa visão otimista esconde uma realidade mais complexa e preocupante.
Precisamos reconhecer que, embora os seguros climáticos ofereçam um alívio financeiro imediato, eles não abordam a raiz do problema: a crescente frequência e intensidade dos eventos climáticos extremos. Depender unicamente de seguros pode criar uma falsa sensação de segurança, desviando a atenção da necessidade urgente de reduzir as emissões de gases de efeito estufa e implementar medidas de adaptação mais amplas e eficazes.
O crescimento do mercado de seguros climáticos
O mercado de seguros climáticos tem crescido exponencialmente nos últimos anos.
Em março de 2025, a bolsa de Nova York lançou um ETF (Exchange Traded Fund) de seguro climático, um sinal claro do interesse crescente do mercado financeiro nesse tipo de produto.
A ideia é simples: oferecer proteção financeira contra perdas decorrentes de eventos climáticos extremos, como secas, inundações, tempestades e incêndios.
Para alguns, os seguros climáticos representam uma forma de adaptação inteligente. No entanto, essa visão otimista esconde uma realidade mais complexa e preocupante.
A urgência climática: um alerta vermelho
Enquanto o mercado de seguros climáticos floresce, os sinais de alerta sobre a crise climática se tornam cada vez mais urgentes.
O relatório “State of the Climate 2024“ aponta para um aumento recorde das temperaturas globais e oceânicas, a diminuição da extensão do gelo marinho e o aumento de desastres climáticos extremos.
Cientistas, incluindo William J. Ripple e Johan Rockström, expressam preocupação com o ritmo acelerado das mudanças climáticas e seus impactos crescentes, afirmando que “Estamos à beira de um desastre climático irreversível. Esta é uma emergência global, sem dúvida. Grande parte do tecido da vida na Terra está em perigo”.
Alexandre Gaspari, jornalista, opina que os avisos sobre as mudanças climáticas foram ignorados e que as previsões foram “conservadoras”.
Essa constatação nos leva a questionar se estamos realmente preparados para enfrentar os desafios que temos pela frente.
As limitações dos seguros climáticos
Em primeiro lugar, os seguros climáticos são, em sua essência, uma ferramenta de gestão de riscos financeiros.
Eles não impedem que os eventos climáticos extremos aconteçam, nem resolvem a causa raiz do problema: as mudanças climáticas.
Além disso, o acesso aos seguros climáticos é desigual.
Em muitos países em desenvolvimento, onde os impactos das mudanças climáticas são mais sentidos, a cobertura de seguros é limitada ou inexistente.
Isso significa que as populações mais vulneráveis são as que menos têm condições de se proteger contra os riscos climáticos.
A filósofa e professora emérita da Universidade Harvard, Shoshana Zuboff, relata em primeira pessoa a experiência de perder sua casa em um incêndio, destacando a “cegueira” para condições sem precedentes.
Esse relato nos lembra que, mesmo com seguros, as perdas decorrentes de eventos climáticos extremos podem ser devastadoras, tanto em termos financeiros quanto emocionais.
O caso do Rio Grande do Sul

Um exemplo claro das limitações dos seguros climáticos é o caso do Rio Grande do Sul, que sofreu perdas de aproximadamente R$ 89 bilhões devido às chuvas.
A Superintendência de Seguros Privados (Susep) informou que os sinistros avisados somaram R$ 6 bilhões até setembro de 2024, indicando uma lacuna de proteção de 93%.
Esses números revelam que a grande maioria das perdas não foi coberta por seguros, deixando muitas pessoas e empresas desamparadas.
Essa situação demonstra que, mesmo em um país com um mercado de seguros relativamente desenvolvido, a cobertura climática ainda é insuficiente para proteger a população contra os riscos crescentes.
A “era dos extremos” chegou ao Brasil
Os eventos climáticos extremos de 2024, como a grande seca na Amazônia-Pantanal e as inundações no Rio Grande do Sul, indicam que a “era dos extremos” já chegou ao Brasil, como avalia o pesquisador do Cemaden, José Marengo.
A diretora interina do Cemaden, Regina Alvalá, afirma que os dados sintetizados na nota técnica permitem conhecer regiões e municípios impactados por eventos extremos em 2024 e contribuem para ações de mitigação.
Os dados do Copernicus mostram que o mundo registrou temperaturas 0,72°C mais altas, na América Latina e no Caribe ficou 0,95°C acima do normal, comparado com o período de 1991-2020.
No Brasil, o aquecimento foi de 0,79ºC, segundo dados do Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet). A maior parte do Brasil registrou anomalias de temperatura acima de 2°C.
Esses dados reforçam a urgência de ações para reduzir as emissões de gases de efeito estufa e limitar o aquecimento global.
Os seguros climáticos podem ser uma ferramenta útil para gerenciar os riscos, mas não são uma solução para o problema em si.
Além dos seguros: a necessidade de ações transformadoras

Para enfrentar a crise climática de forma eficaz, é preciso ir além dos seguros e adotar medidas transformadoras em diversas áreas.
É fundamental investir em energias renováveis, reduzir o desmatamento, promover a agricultura sustentável e adaptar as cidades para resistir aos impactos das mudanças climáticas.
Além disso, é preciso garantir que as populações mais vulneráveis tenham acesso a informações, recursos e tecnologias que lhes permitam se adaptar aos riscos climáticos.
A justiça climática deve ser uma prioridade, garantindo que os custos da transição para uma economia de baixo carbono sejam distribuídos de forma equitativa.
Os seguros climáticos podem desempenhar um papel importante na gestão dos riscos climáticos, mas não são uma panaceia.
Para enfrentar a crise climática de forma eficaz, é preciso uma abordagem abrangente e transformadora, que envolva governos, empresas, sociedade civil e cidadãos.
Bom, o futuro climático do planeta está em jogo.
Se continuarmos a ignorar os sinais de alerta e a adiar as ações necessárias, corremos o risco de enfrentar um desastre climático irreversível.
Precisamos de uma mudança profunda em nossos valores, em nossas práticas e em nossas políticas. Precisamos de uma revolução climática que nos leve a um futuro mais justo, mais verde e mais seguro.
Fontes: